quinta-feira, 27 de outubro de 2011



Não sei quem sou que alma tenho.
Quando falo com sinceridade não sei com que sinceridade falo.
Sou variamente outro do que um eu que não sei se existe (se é esses outros)...
Sinto crenças não tenho.
Enlevam-me ânsias que repudio.
A minha perpétua atenção sobre mim perpetuamente me ponta traições de alma a um caráter que talvez eu não tenha,
nem ela julga que eu tenho.
Sinto-me múltiplo.
Sou como um quarto com inúmeros espelhos fantásticos que torcem para reflexões falsas uma única anterior realidade que não está em nenhuma e está em todas.
Como o panteísta se sente árvore (?) e até a flor,
 eu sinto-me vários seres.
Sinto-me viver vidas alheias, em mim, incompletamente,
como se o meu ser participasse de todos os homens,
 incompletamente de cada (?),
por uma suma de não-eus sintetizados num eu postiço."
Fernando Pessoa 

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